Antes de entrar no confronto destes dois conceitos vale voltar um pouco e compreender qual o significado de seus radicais.
Aprimorar surge de primor, que pode ser entendido como uma grande qualidade, algo que denota perfeição. Facilmente podemos deduzir que aprimoramento nada mais é que potencializar algo, tornar melhor determinada qualidade. O prefixo auto denota a noção de próprio, de si próprio e por si próprio. Juntando estes dois conceitos temos no autoaprimoramento a definição de que nós somos responsáveis por reforçarmos uma ou mais de uma determinada qualidade por méritos próprios. Elevando nossa qualidade para que sejamos a referência, sejamos ímpares, indubitavelmente bons.
Observamos isso com muita constância em nosso dia a dia. Nossa cultura é propensa a potencializarmos nossas qualidades e fazer com que geralmente encaremos nossos pontos falhos como algo imutável, como características que não podemos mudar drasticamente, no máximo atenuar. Somos levados a reforçar em nós nossos pontos fortes e trabalhar para torná-los ainda mais fortes e robustos. Somos motivados a alcançar sucesso.
Isso influencia fortemente na forma com que encaramos nossos erros e pontos falhos. Desde pequenos não somos acostumados a encarar nossos erros, mas a ressaltar nossos pontos fortes, nossas qualidades.
Pesquisas mostram que estudantes americanos quando submetidos a testes repetidos tendem a se esforçar mais nos que se saíram melhor, quando lhes e dada a chance de repetir o teste sem valer nada mais, ao invés de repetir os que se deram pior. E em outra é apontado que na sala de aula as professoras do ensino fundamental, de forma bem mais comum, quando percebem que um aluno errou interrompem o exercício para apontar-lhe a solução ou invés de dar margem e tempo para que ele encontre por si só o erro.
Como o autoaperfeiçoamento se mostra no trabalho? Nos torna um pouco mais egoístas e individualistas. Como somos focados em ressaltar nossas qualidades, num ambiente competitivo, isso gera uma corrida pela posição de destaque, pela posição de melhor desempenho, que nos faz priorizar o individual ao invés do coletivo, nos faz ver o eu e somente depois o nós. Quando encaramos uma falha, essa característica nos faz pender mais para a desistência do que para a perseverança.
Outro aspecto dele pode ser resumido da seguinte forma: somos levados a creditar que possuímos certas características mais ressaltadas que outras, e que com esforço e treino podemos torná-las ainda melhores até atingirmos seu máximo. E isso é bom? Sim, claro que sim. Tornarmo-nos referência em um aspecto é válido, e muito.
A faceta negativa disso é que reafirmamos essa boa qualificação de nós mesmos até nos pequenos detalhes, uma vez que ela está altamente atrelada a nosso ego. Essa massagem constante nos torna permissivo ante nossos pontos fracos, ante nossos erros, pois, tendenciamos a negar pequenas falhas pelo medo de estar errado, pelo medo da exposição de ser falho. Tendo em mente que sempre faremos uma propaganda positiva a nosso respeito, aos poucos vamos deixando de ter consciência sobre nossos defeitos e nos autoiludindo sobre determinados comportamentos.
Suponha que uma vez saindo de um estacionamento à noite você sentiu que seu carro esbarrou de leve no vizinho. O que você pensaria? Acharia que não foi nada, afinal foi muito leve, ou que então estava escuro de mais e não tinha como você ter certeza, ou ainda que o motorista vizinho espremeu sua vaga? Caso tenha pensado assim, com base em que fatos você tirou alguma dessas conclusões? Desceria para ter a confirmação?
Quando somos acostumados a reforçar nossas boas características nos tornamos um pouco presunçosos a ponto de ser bem mais fácil apontar a escuridão ou o espremido da vaga como justificativa pelo choque entre os carros do que descer, confirmar a falha, e procurar alguma forma de remediá-la. Isso está profundamente ligado a como encaramos o erro, como tratado em outro artigo.
Já o autoaprimoramento é o oposto. Ao invés de reforçarmos nossas qualidades focamos nossos pontos fracos. Entendemos que somos falhos e que os erros não são motivos de vergonha, mas uma chance de melhoria. Encaramos o reconhecimento da falha pública não como vexame pessoal, mas como falta de coletividade, pois, nossa pisada na bola prejudicou o grupo, acima de tudo.
Na sala de aula, a japonesa por exemplo, a professora não interrompe o aluno que está fazendo a atividade errada, ela faz com que se indague sobre o caminho que está tomando, embora isso leve mais tempo e ele precise se esforçar mais para identificar o erro e aprender. Costumeiramente ela faz com que ele levanta e vá até o quadro expor seu erro perante todos e veja isso não como uma exposição constrangedora, mas como um “olhem, vocês podem melhorar se conhecerem que essa forma errada de fazer deve ser evitada”.
Na italiana, é comum professores exporem os erros dos alunos até mesmo de forma mais grosseira, porém o foco é a persistência no encontro da solução, sem entramos no mérito da forma com que isso é feito.
Quando o foco é o autoaprimoramento, perde-se um pouco a característica da individualidade e passa-se a pensar mais em coletividade, pois é nela em que encontra-se o apoio para que nossos pontos fracos sejam superados. Quando esse é o foco, é o bem estar coletivo e a reputação do grupo, que importa, mais que o individual. Ao invés de termos nosso ego massageado é a honra da equipe que vale mais que nosso sentimento no momento. É o bem estar da sociedade faz com que desçamos do carro e confirmemos se houve mesmo o arranhão no carro vizinho e em caso positivo tentemos encontrar uma solução ao invés de dar as costas e ir embora.
Enquanto o autoaperfeiçoamento nos motiva a alcançar o sucesso o autoaprimoramento nos motiva a evitar os erros. Enquanto em um temos o destaque de uma mentalidade fixa, em que pouco ou quase nada podemos fazer para mudar nossas características, em outro, temos que todas elas são mutáveis desde que nos esforcemos para tal.
Mas nem em um nem em outro temos um modelo ideal. Se um destaca a individualidade, que promove talentos únicos, em discrepância com a grande massa e entre suas próprias características, já que premia o resultado, no outro, temos o coletivo como talento, que premia o esforço e a persistência, mas negligencia a individualidade de seus componentes. Isso não significa que o autoaperfeiçoamento ignore o coletivo nem que o autoaprimoramento o faça com a individualidade, pelo contrário, ambos “sabem” a importância desses conceitos, apenas o tratam de forma diferente.
Ambos, quando bem entendidos, podem potencializar uma equipe e alavancar resultados. Um líder consciente desses aspectos consegue coordenar o trabalho de sua equipe. No momento certo, ele saberá reconhecer o indivíduo e noutro o coletivo. Fará com que ele seja capaz de tornar sua equipe capaz de enxergar em suas ações exemplos, tanto de boas práticas que podem ser potencializadas, quanto de outras que precisam ser aprendidas e, principalmente, quanto aos erros e em como eles devem ser encarados e superados.
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